Dois poemas de Anna Akhmátova
Asa
Eu vivo como um cuco no relógio.
Não invejo os pássaros livres.
Se me dão corda, canto.
Só aos inimigos
Se deseja
Tanto.
(Anna
Akhmátova (А́нна Ахма́това), no livro “Poesia da recusa”. [organização e
tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva,
2006.)
Quando morre um homem
Quando morre um homem
Todos os seus retratos mudam.
Os olhos observam-nos de forma
diferente,
Os lábios sorriem com outro sorriso.
Dei por isto ao regressar
Do funeral de um poeta.
Constatei-o depois inúmeras vezes
E a minha suposição confirmou-se.
(Anna Akhmatova. É por isso que a alegria é mais
alta - poemas russos dos séculos vinte e vinte um. 2022)
Sobre a autora
Anna Akhmátova nasceu em
Odessa, Ucrânia, com o nome Anna Gorenko, em 23 de junho de 1889. Cedo se
interessou pela poesia, paixão que o pai não apoiava e que a obrigou a adotar o
pseudónimo Anna Akhmátova (apelido da bisavó materna). Em 1907, ingressou na
escola de Direito em Kiev e, em 1910, casou-se com o poeta e crítico Nikolai
Gumliev.
Em
1912, nasceu Lev, filho do casal, mesma data em que Anna publicou o seu
primeiro livro, o que lhe abriu as portas para a cena literária de São
Petersburgo. Akhmátova tornou-se, em conjunto com Gumliev, líder do Acmeismo –
movimento literário russo que, em oposição ao Simbolismo, defendia o verso
lúcido e cuidadosamente construído.
Em
1918, a poeta divorciou-se de Gumliev, voltando a casar-se por duas vezes,
primeiro com Vladimir Shileiko e depois com Nikolai Punin.
Em
1921, após o assassinato de Gumliev pelos bolcheviques, as oportunidades de
publicação escassearam para Akhmátova (dada a ligação que mantinha com
Gumliev), o que fez com que se dedicasse à crítica literária de autores como
Púchkin e à tradução. A mudança da situação política permitiu a entrada de
Akhmátova no Sindicato de Escritores. No entanto, o agravamento da 2ª Guerra
Mundial levou à sua expulsão do Sindicato, bem como à banição oficial da sua
poesia. Morreu em Leninegrado, cidade onde viveu grande parte da sua vida, em
1966.
Entre
os seus trabalhos mais aclamados encontra-se Réquiem, uma reação ao período de
terror stalinista. Na área da tradução, Akhmátova trabalhou autores como Victor
Hugo, Rabindranath Tagore e Giacomo Leopardi.
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