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Andar a tempo não é o mesmo que andar atento / Miguel Filipe Mochila

 


CRAVO

 

Entre os mil cravos da minha infância, escolhi o branco

          e breve aquele

que em San Juan achei havendo-o perdido

a milhares de quilómetros de Porto Rico

em meio do asfalto

em outro santo ido

Bento este, pobre

Ou seja, do Mato, vulgo Azaruja.

Morto, foi da morte que o colhi. Como explicar

que por o não ter visto nunca

outra vez além o vi.

Andar a tempo não é o mesmo que andar atento.

A gente desperta um dia neste estranho, estranho

          mundo, e principia sempre em,

e chega sempre, ao estrangeiro:

cândidas, e logo apaixonadas, e enfim frustradas, se nos

          perdem as coisas, as ideias, as grandezas,

e sobram-nos só aquelas, frugais e fraternas, que

          perdemos na infância.

A isto chamamos beleza, mas a beleza

está só nas coisas belas, e elas fogem-nos sempre, para

          que possamos

continuar a dizê-las belas, a beleza.

Como aquela flor da infância:

como explicar

que num futuro

campo

é que a perdi.

 

(Miguel Filipe Mochila. Nervo/21. Coletivo de poesia. maio/agosto 2024)

 

Sobre o autor:

Miguel Filipe Mochila nasceu em Évora, em 1988. Tem colaborado com a imprensa em matéria cultural relacionada com as literaturas ibéricas e ibero-americanas, de que é investigador. Traduziu autores como Roberto Arlt, Julio Cortázar, Juan José Saer, Samanta Schweblin, Ernesto Sábato, Adolfo Bioy Casares, Blas de Otero, Nicanor Parra, Joan Margarit, Luis Alberto de Cuenca, Ángel González ou Claudio Rodríguez. Além de poemas publicados em revistas e fanzines, publicou os livros Tempo da Impaciência, em 2016, e Com a Língua nos Dentes, em 2018, ambos na Artefacto.

2 comentários:

  1. Bom dia. Gosto muito dessa forma de escrita e esses jogos de palavras tipo "a tempo e atento" ou, como diria Ednardo "adeus e a Deus". Abraços ao Poesia e ao Miguel Mochila.

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  2. Poesia é o espelhos da alma

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O Poesia na Alma pertence ao universo da literatura livre, como um bicho solto, sem dono e nem freios. Escandalosamente poéticos, a literatura é o ar que enche nossos pulmões, cumprindo mais que uma função social e de empoderamento; fazendo rebuliço celular e sexo com a linguagem.

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