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Quatro poemas de Vera Lúcia de Oliveira

 



roça a língua de setembro sobre o mundo

com seu osso com seu dorso de vocábulo

limpa escadas lustra a casa lava e encera e passa

essa demora de memória que não passa

 

*****

 

não ir pelo temporal nem pelo cheiro de pão

não roçar a campainha em noite de vendaval

não beirar as paredes como um cego que precisa do tato para sobreviver

não cruzar a linha da luz onde a poeira balança sem memória

não ir pelo caminho mais curto

não telefonar para as fotografias dos mortos

 

*****

 

memória é medo

que se entreva

entre as teias

do corpo

memória é osso sem carne

que cobrimos

da melhor forma

possível

para que não

sangre

 

*****

 

encheu um copo de terra

achando que iria bebê-la

com água antes da viagem

caso aportasse em terra estrangeira

traria dentro o nome

de onde viera

 

Sobre a autora:

Vera Lúcia de Oliveira é poeta, ensaísta e professora de Literaturas Portuguesa e Brasileira na Università degli Studi di Perugia. Entre os prêmios que recebeu está o de Poesia da Academia Brasileira de Letras, em 2005. Tem poemas e ensaios publicados no Brasil, Itália, França, Alemanha, Romênia, Estados  Unidos,  Espanha  e  Portugal. 

Fonte: (Te r e s a [recurso eletrônico]: revista de literatura brasileira 19 / organização: Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, área de Literatura Brasileira. – São Paulo: fflch/usp, 2018)

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