Sei que o pescador foi ao mar | Paulo Silva
I
sei que o pescador foi ao mar.
contudo
encantou-se pela rede:
encostou o olhar no fora de sua tessitura
e viu
o pão do amanhã.
abriu-a sob sol e contemplou-a seca sem
peixes.
o pescador olhava o mar
perto e distante ao mesmo tempo
mas a rede:
pendia de suas mãos
longos dedos
em perfeita simetria do caos.
…
lançou a rede ao mar
e abriu um olhar vertical:
a água molhou-lhe as entranhas
devolveu-lhe o dom.
engravidou-se.
II
acima
alheios à noção de ser
estão os pássaros
e voam.
III
epílocu
arranquei do meu cu
as pregas
da moral o dedo
indicador do pecado
a visão de dois (mil) olhos
que veem
menos
que um.
Sobre o autor:
Paulo
Silva (ou paulo tassa) nasceu em 1985, na cidade de
Manhuaçu (Minas Gerais). É doutor em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa
(2023) pela Universidade de Coimbra e mestre em Literatura Brasileira e
Comparada (2012) pela mesma instituição. Licenciou-se em Letras pela PUC Minas
(2010). Em 2018, estreou na poesia com “caída” (2018, Letramento) e em 2021
lançou “o homem à espera de si mesmo” (poesia, Mosaico).
Instagram: @paulosingular
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