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Por que Subestimam o Povo? | por J.M. Gouvêa

 

(Joaquim Osório Duque-Estrada (1870-1927) foi um poeta brasileiro. Autor da Letra do "Hino Nacional Brasileiro".)


Bom, vamos à polêmica. Zapeando pelos vídeos curtos de alguma rede social, me deparei com um pseudo-intelectual. Destes que cita livros que leu apenas o resumo (vide Fahrenheit 451). Ele bradava que o hino nacional brasileiro era excessivamente parnasiano e que assim o era de propósito, para que o povo não o entendesse. Ao meu ver existem dois problemas nessa afirmativa, e eu gostaria de compartilhar minha visão com vocês e espero do fundo de meu coração que vocês exponham suas opiniões nos comentários.

 

Primeiramente, devemos considerar que a letra do Hino Nacional Brasileiro foi escrita no início do século passado. Obviamente a norma culta era diferente e os costumes e vocabulário da época eram outros. Ao meu ver, é um retrato daquele momento e deve ser interpretado como tal. Para uma pessoa de 2023 pode soar bem complexo realmente, mas se ouvido há 100 anos, provavelmente era mais facilmente interpretado. Devemos levar em consideração também que não é um texto didático, muito menos técnico. É uma música. Uma poesia que precisa ter ritmo, métrica e dinâmica. Não que uma prosa não precise, mas versos e estrofes se alimentam de coisas assim. E obviamente precisa ser lírico. É necessária a beleza quando se constrói um símbolo nacional. Ele irá representar nosso país, nossa cultura e nossa gente pelo mundo inteiro. Você não gostaria de ser representado ou representada por algo xoxo, gostaria?

 

Em segundo lugar, identifico uma problemática muito grande em se aliar o erudito ao discriminatório. Aliás, discriminatório para mim é presumir que alguém não irá entender algo só porque é “do povo”. Naquele tempo já existiam dicionários e hoje em dia andamos com enciclopédias completíssimas ao alcance de um ou dois cliques. Mesmo que o verbete não seja usual, uma mente interessada – e estimulada a tal – pode rapidamente se inteirar de seu significado. Ou o smartphone só nos permite decorar dancinhas e ficar por dentro das fofocas dos artistas?

 

Eu mesmo já ouvi críticas aos meus poemas por utilizar palavras “difíceis” e de complexa compreensão. É claro que em 2023, é temeroso elaborar um texto similar ao de nosso hino nacional, com o risco de parecermos anacrônicos. Mas imagino que um texto se torna monótono, repetitivo e previsível se escrito apenas com palavras do “dia a dia”.

 

Precisamos entender que quanto maior é o vocabulário de uma pessoa, maior é seu poder de análise e de discernimento cognitivo. Com o pretexto de defender os interesses do povo, muitos o rebaixam e o subestimam. O povo não é burro, é apenas subestimado. E um povo que acredita ser incapaz de entender as coisas, é mais facilmente usurpado e vilipendiado.

 

Enfim, essa foi minha consideração sobre o tema. Agradeço pela atenção e espero não ter sido prolixo, copioso, dilatado, fraldoso, verborrágico, difuso, loquaz…



11 comentários:

  1. Pseudo-intelectual é daqueles que aparecem em assuntos que menos esperamos, já me deparei com alguns 'puxando' temas ridículos e que nem faz sentido mais hoje em dia. Gostei da reflexão e pessoas assim sempre surgem onde menos esperamos.

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    1. Debyh, obrigado pelo seu comentário! Temas sem sentido são o arroz com feijão dos pseudo-intelectuais hahaha

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  2. Olá. A meu ver, de toda forma, o hino não foi escrito exatamente para o povo. Uma vez que sua compreensão mais profunda exige um certo nível de estudo de História. E a educação no país sempre foi precária para manter o povo alienado e não ciente de sua
    própria dominação disfarçada de independência. Ele representa uma visão romantizada e colonizadora da nação, mesmo com sua dita "independência". Mas o povo ficou totalmente independente do governo? E já foi muito utilizado em uma tentativa de propagar o falso patriotismo e ideia de unificação do povo em campanhas de governos ditadores. Por isso, se perdeu o significado. Ou pelo menos, pra muitos brasileiros discriminados já não significa nada. Vejo por esse ponto também. Enfim, interessante conferir o seu ponto de vista. Não acho as palavras complexas, apenas poéticas e com muitas expressões portuguesas, digamos assim. Mas estão abertas há interpretações. Essa é a minha interpretação por uma visão crítica e de historiadora

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    1. Debora, muito obrigado pelo seu ponto de vista!

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  3. Oi.
    É bem comum nos depararmos com pensamentos assim, de que as coisas coisas já estão ultrapassadas e precisam de uma reformulação. Em certos caso é até necessário e compreensível, mas tem coisas que obviamente são retratatos de uma época e que precisam de preservação. Entendo que a língua é viva, acompanha a evolução do povo, mas isso não significa extinguir o que já foi registrado, no entanto também entendo a necessidade de ser chegar a mais públicos, já que infelizmente não somos um país, na prática, igualitária, infelizmente.

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    1. Pedro, obrigado pelo seu tempo! Gostei muito de como você pôs em palavras, resumidamente, o assunto de maneira tão bem descrita. Concordo bastante com você.

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  4. Mesmo com a utilização de palavras que não são tão comuns na atualidade, eu me encanto com a poesia do nosso hino. Gostaria que ele fosse mágico e transformador. Que ao entoa-lo nós nos transformássemos em um povo com mais amor pelos seus.
    Mas, chega de utopias. Eu gostei muito da sua colocação... Bem longe de verborragias. Todavia pontual. Muito obrigada pela reflexão do dia.

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    1. "Chega de Utopias" deveria estar escrito na nossa bandeira! Obrigado pelo seu comentário, Carol!

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  5. Oi, tudo bem? Achei interessante essa reflexão. Primeiro quanto ao rapaz que lê apenas resumos, como assim? Acredito que nem lendo somente uma sinopse ou resenha é possível ter ideia do impacto de um livro. Quanto as palavras "difíceis" ou jeito erudito de escrever eu gosto, principalmente nos clássicos da literatura como O cortiço, A moreninha, entre outros. Uma leitura mais densa tem mais chances de nos ensinar algo do que leituras mornas. Um abraço, Érika =^.^=

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    1. No livro Fahrenheit 451 de Ray Bradbury, no futuro os livros eram super resumidos para que todos pudesse "conhece-los". Procure para ler, você vai adorar.

      Muito interessante essa ideia de que um texto rebuscado fale mais ao nosso intelecto. Talvez como uma comida bem temperada atiça mais o nosso paladar? Muito obrigado pelo seu tempo e volte sempre!

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  6. Oi, tudo bem? Achei interessante essa reflexão. Primeiro quanto ao rapaz que lê apenas resumos, como assim? Acredito que nem lendo somente uma sinopse ou resenha é possível ter ideia do impacto de um livro. Quanto as palavras "difíceis" ou jeito erudito de escrever eu gosto, principalmente nos clássicos da literatura como O cortiço, A moreninha, entre outros. Uma leitura mais densa tem mais chances de nos ensinar algo do que leituras mornas. Um abraço, Érika =^.^=

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O Poesia na Alma pertence ao universo da literatura livre, como um bicho solto, sem dono e nem freios. Escandalosamente poéticos, a literatura é o ar que enche nossos pulmões, cumprindo mais que uma função social e de empoderamento; fazendo rebuliço celular e sexo com a linguagem.

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