Entraste em mim como uma nódoa | Edih Longo
A ARTE DE SER
MULHER
Entraste
em mim como uma nódoa, como uma epidemia te alastraste
por
todo o meu território e não reclamei.
E
fui te amassando como um bolo.
Deixei-me
usar porque sou assim:
uma
eterna esperança num coração tolo.
Fizeste
festa em meu peito vazio, enfim,
aceitei as evidências.
Eu
precisava de ti como o oxigênio
que
o planeta indiferente aspira o quanto quer.
Deixei-me
subjugar porque sou assim:
uma
criança com invólucro de mulher.
Chegaste
pé ante pé como uma marido infiel.
Bailaste
no salão de minha alma
curiosa
de vida e pedindo bis
deixei-me
ter porque continuo sendo assim:
uma
mulher com sonhos infantis.
Agora,
vai, deixa-me fugir de ti/de todos/de mim
quero
apenas me aquietar em meu corpo tão cansado. Adeus, passado!
Fiques
no baú. Quieto e confinado. Usar-te-ei para não pisar em outro terreno minado,
porque eu sou assim:
um
ser que ama sem se preocupar em ser amado.
Não
consigo entender coisa nenhuma, às vezes, coisa qualquer.
A
única coisa que não aceito como alcunha
é
que me digam que abuso da arte de ser mulher,
pois
é, vou ser sempre assim:
onde
estiver, caberei sempre no lugar que eu
quiser.
A
PORTA-BANDEIRA
Mão
na cintura.
Os
passos, alterna com soltura.
Desliza
os pés com beleza.
Balança
os quadris com leveza,
deixa
o corpo agir
como
se fosse morrer na próxima esquina
e
a nádega confirma o requebro,
enquanto
empina.
Segura
um mastro com um pano e símbolo.
É
a imagem de sua tribo.
Sente
a multidão.
Sorrisos
em profusão,
mesmo
sem dentes,
os
rostos estão contentes.
Do
jeito que ela gosta, sempre disposta
e
vivendo plenamente.
Quarta
cinza tudo volta ao normal.
Salário
sem fim de mês, mas não faz mal.
Quem
chora é a cuíca, que repica
de
alegria.
Esquece
a periferia.
Hoje
é área nobre. Sofrer é lixo podre.
Faz
mesuras com graça. Amanhã passa.
Amanhã
é hoje que não veio.
Curte
seu sonho de samba com recheio.
Amanhã
é operária.
Hoje
quer aplausos,
mesmo
falsos.
Hoje
é só mulher,
forte
e firme como outra qualquer.
Amanhã
mais um pária
que
sobe a favela.
Hoje
é bela! Amanhã, a fera.
Carnaval,
quando ele chega, nada é mais normal
que
feliz ritual!
Madeira
que um País pariu.
Terra
Brasil.
Porta
a bandeira
defendendo
uma comunidade inteira.
Importa
sua situação financeira?
Tem
muito orgulho de ser brasileira.
FIM
Sobre a autora:
Edileuza
B. L. Longo ou Edih
Longo, é Linguista e Prof.ª de Língua Portuguesa, formada pela USP/SP. Tem
também formação teatral e faz parte do Grupo "Arte in Cena" do Clube
Paineiras do Morumbi. Além de atriz, é poeta, contista, cronista, romancista e
dramaturga. Ganhou prêmios nas modalidades. Atualmente aposentada, dedica-se a
adolescentes carentes, ministrando-lhes aulas de Teatro.
Instagram: @45edih_longo_46
(Texto selecionado para o projeto Leitura Feminista, iniciado em 2019, em parceria com o
blog Barda Literária que este ano, no mês de março, apoiará poetisas)
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