Resenha – Mulheres e caça às bruxas
By imagem - carta capital
Mulheres
e caça às bruxas, de Silvia
Federic, é o terceiro livro selecionado para o Projeto Leitura Feminista (criado pelos blogs Barda Literária e
Poesia na Alma) #ProjetoLeituraFeminista, em parceria com a Editora
Boitempo. Dando continuidade ao livro Calibã e a bruxa, Federic apresenta a
história da perseguição as bruxas e suas motivações e como isso ainda acontece
na atualidade, principalmente em países como Congo, Quênia, Gana e Nigéria,
Índia e as relações política, econômica e religiosa que financiam essa
violência.
Na Índia, o assassinato de bruxas é igualmente desenfreado – ainda mais em ‘terras tribais’, como o território dos adivasi, onde estão em curso processos de privatização de terra em larga escala. E o fenômeno está se expandindo. Temos relatos, atualmente, de assassinatos de bruxas no Nepal, na Papua Nova Guiné e na Arábia Saudita. O estado Islâmico também executou ‘bruxas’. Assim como no século XVI, a tecnologia contribui para a perseguição. Hoje, imagens de assassinatos de bruxas podem ser baixadas na internet, assim como manuais que indicam como reconhecer uma bruxa. Também há relatos de que, entre autodenominados perseguidores de bruxas dos tempos atuais, alguns usam computadores para ‘desmascarar’ seus alvos!
Nesse contexto, Silvia Federic desafia o
óbvio quando busca as origens dessa perseguição as ‘servas do diabo’,
questionando inclusive alguns estudiosos que enxergam o fenômeno como algo
natural ou cultural. A nova caça às bruxas é carente de análises, bem como
compreender sua história que privou as mulheres de seus conhecimentos básicos na
medicina e as submeteu ao controle patriarcal e exploração do corpo feminino.
A maioria das historiadoras e dos historiadores da caça às bruxas, mesmo entre profissionais de maior motivação política, se restringe às análises sociológicas: quem eram as bruxas? De foram acusadas? Onde e como foram punidas? Ou, então, considera a caça às bruxas a partir de um ângulo limitado: o nascimento da profissão médica, o desenvolvimento de uma perspectiva mecânica do mundo, o triunfo de uma estrutura patriarcal, e assim por diante.
A autora compreende que a caça às bruxas forneceu
munição para materialização do Capitalismo no mundo, isso porque com o
surgimento do Capitalismo agrário, no fim do século XV, na Europa, a privatização
de terras contribuiu para a
demonização de mulheres. Analisando os mapas de julgamentos de bruxas, a autora
revela que coincidiam com as terras onde haviam cerceamento de terras, além disso os
julgamentos das bruxas começaram no século XVI e tiveram seu auge no século
XVII, quando a relações econômicas eram reformuladas em prol do mercado e a
desigualdade social era descomedida.
A mudança econômica atingiu diretamente as
mulheres, principalmente, as mais velhas. Se na sociedade rural senhoril
inglesa, as viúvas tinham direito a subsistência garantida, no novo sistema, a
perda dos direitos consuetudinários e a alta de preços, não oportunizam fontes
de sustento, o que gera outra causa para acusação e bruxarias. As mulheres
pobres das comunidades que tentavam sobreviver a marginalização, começavam a
ser vistas como um inconveniente, acusadas de falarem palavrões e causarem
tumulto
(...) acusações que historiadoras e historiadores muitas vezes acataram. Podemos, porém, questionar se por trás das ameaças e das palavras maldosas, não deveríamos captar um ressentimento nascido da raiva pela injustiça sofrida, uma forma de rejeitar a marginalização.
A bruxa também era a mulher libertina,
obscena, com filhos fora do casamento, fora do padrão de feminilidade,
sexualidade diabólica e curandeira. Tudo aquilo que fugia do poder do Estado e
da Igreja era considerado diabólico, impuro e um caminho certo para o inferno. Associar
a figura do Diabo a da mulher, também fortaleceu a ideia que só um homem pode
salvar a humanidade, portanto, para sobreviver, restou as mulheres tornarem-se cúmplices da guerra contra as
bruxas, aceitarem a liderança dos homens e seus lugares no Capitalismo.
Em outras palavras, as mulheres foram acusadas de bruxaria porque a reestruturação da Europa Rural no início do Capitalismo destruiu seus meios de sobrevivência e a base de seu poder social, deixando-as sem nenhum recurso além da dependência da caridade de quem estava em melhores condições.
Vale frisar a forte limitação da
sexualidade feminina por autoridades religiosas, principalmente Martinho Lutero,
e do Estado como pilar da moralidade social e da estabilidade política.
Com base nas evidências mais frágeis (...) milhares foram detidas, desnudas, tiveram o corpo totalmente depilado e, então, perfurado com longas agulhas na busca da ‘marca do diabo’, em geral na presença de homens – do carrasco aos notáveis e aos sacerdotes da localidade. (...) As crueldades mais sádicas já inventadas foram infligidas ao corpo da mulher acusada, que serviu de laboratório ideal para o desenvolvimento de uma ciência de dor e tortura.
Hoje, a caça às bruxas tem relação
histórica direta com a acumulação do capital, um novo tipo de violência com tendências estruturais constitutivas do
desenvolvimento do capitalismo. Com a globalização, a brutalidade no ataque contra
a mulheres, comunidades tribais (povos nativos), negros e comunidade LGBTQ+ tem
a função de transmitir uma mensagem de não
esperar nenhuma compaixão, para que o processo político de recolonização,
entrega dos recursos naturais, apropriação de terras, guerras e devastação da
natureza possam acontecer sem protestos e inibindo mulheres e comunidades de
autonomia e independência.
Por trás disso, podemos encontrar grandes
instituições como Banco Mundial e Nações Unidas que moldam a política econômica
global, estabelecem regras e, dessa forma, milícias ganham força para atirar na vagina
de mulheres em capôs de extração de Diamantes. Ou como desde 1990, por toda a
África mulheres são exiladas em ‘campos de bruxas’. Além de campanhas de ‘limpeza’,
com perseguidores de bruxas que vão de aldeia em aldeia, submetendo pessoas a
interrogatórios e mulheres tendo suas terras confiscadas, além de serem
torturadas e assassinadas das formas mais brutais. As seitas religiosas (pentecostais e sionistas) evangelizadoras
ganham notoriedade nessa conjuntura por contribuir com esse cenário quando, por
meio da evangelização pregam a ideia do satanismo,
doença e morte.
A caça ás bruxas é lucro e poder, o Banco
mundial lança a campanha ideológica para promover a comercialização das terras,
principalmente na África (a América
Latina não está longe dessa realidade) e as seitas religiosas evangelizadoras
e a mídia, também pelo lucro e manutenção do poder, contribuem com o processo
de “colonização global”.
Oi Lilian!!
ResponderExcluirAchei a proposta desse livro incrível!! Eu não o conhecia assim como também não conhecia a autora, mas, fiquei completamente interessado na leitura do mesmo, foi muito inteligente da autora fazer um trabalho em que desmistifica a bruxaria e como a bruxaria era uma ferramente para manter as mulheres "sob controle"!! Vou por esse livro em minha lista de leitura.
Beijos!
Eita Já Li
Olá,
ResponderExcluirParece um livro de bastante pesquisa, o que me faz interessar pelo livro, gosto de coisas assim bem estruturadas em livros de não-ficção. É um tema bem abrangente e a autora parece ter pegado os acontecimentos por vários lugares do mundo.
esse livro é maravilhoso, aprendi muito com ele, aprendi coisas que não fazia ideia, principalmente que a ''cultura'' da mulher como bruxa continua firme e forte e tão semelhante aos seculos passados nos dias de hoje, foi uma leitura que marcou.
ResponderExcluir"Eles estão queimando todas as bruxas mesmo que você não seja uma." Já dizia Taylor Swift. Vi a resenha no blog da Letícia e olha... sensacional essa leitura! Adoro ter conhecimento de vários assuntos, e as bruxas são pessoas tão importantes né? Tão vilanizadas e perseguidas. Inclusive, perseguiam-se mulheres com essa justificativa. Fugiu da norma patriarcal? você é bruxa! Vá pra fogueira. Quero ler!
ResponderExcluirA Editora Boitempo sempre editando livros fantásticos!
ResponderExcluirCom certeza ele vai pro topo da minha listinha de desejados.
É curioso como que a influencia da igreja sempre exerceu muito poder por nós, meras humanas.
Imagino o quanto que essas mulheres sofreram na mão deles. Uma triste realidade que nós temos por obrigação espalhar para o mundo!
Ótima resenha, fotos lindas!
Puts que resenha mais completinha, aprendi tanta coisa lendo isso aqui que nossa <3 Obrigada por isso. Fiquei curiosa por esse livro desde quando a autora veio ao Brasil, certamente depois de ler tudo isso aqui, vou ler o mais rápido possível.
ResponderExcluirNão conhecia essa editora, mas independente disso, dei print do livro, pois estou extremamente curioso para saber dessa história na íntegra, gosto demais desse assunto e confesso que não espero a hora de começar a ler.
ResponderExcluirOlá! Esse livro me parece algo bem concreto e bem pesquisado. Sinceramente está muito além do que eu procuro em uma leitura, mas bruxas são algo que eu realmente gosto de estudar. Eu adoro documentários e filmes sobre a época da Caça as Bruxas no século XV e XVI. Então mesmo que não seja uma leitura que eu faria futuramente, com certeza é algo que me interessante.
ResponderExcluirBeijo!
http://www.capitulotreze.com.br/
Gente, olhando por esse lado, a caça às bruxas nunca acabou, apenas mudou de nome... e faz total sentido! Amei saber mais esse livro, ainda mais nos tempos em que vivemos!
ResponderExcluirBjks!
Mundinho da Hanna
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Gostei bastante de conhecer melhor esse terceiro livro selecionado para o Projeto Leitura Feminista. Porque esse é o tipo de livro que levanta muitas questões importantes. Eu tenho interesse pelo assunto. Então acho curioso saber mais sobre. Essa proposta do livro me chamou atenção logo de cara. Eu faria essa leitura, com certeza. Ótima indicação e necessária.
ResponderExcluirOii! Estou fas-ci-na-da! Amo projetos de leituras feministas! Envolvem força, história, reflexões, ouso até dizer de um cadinho de nó e embrulho no estômago (rsrs), porém necessário a pensarmos em muitas questões. Não conhecia o livro, mas me chamou, e muito! Parece uma leitura bastante fundamentada, contextualizada! E a sua resenha, muito bem detalhada, me alimenta nesta vontade de querer, e muito, ler este livro! Grata por me possibilitar conhecer este belo material! Um beijo!
ResponderExcluirOlá, Lilian. Tenho bastante curiosidade em ler Caliban e a Bruxa, tenho até a versão em e-book no meu Kindle. Só estou aguardando um momento em que eu não esteja tão ansiosa para fazer essa leitura. Agora, adiciono mais um em minha lista, pois me interessei por Mulheres e a caça as bruxas, após ler sua resenha. Obrigada e abraços.
ResponderExcluirUau! Simplesmente estou sem fôlego com a sua resenha! Fico sempre encantada com todos os livros desse projeto que você traz aqui, mas esse se superou e muito! Parece uma leitura maravilhosa, super embasada e muito completa. Adorei. Muito obrigada pela recomendação!
ResponderExcluirEita, capricharam na resenha, viu?
ResponderExcluirA cada dia que passa me da mais asco desses pentecostais FDP. 🌻
Esse livro tá minha lista de desejados. Ia agregar bem a leitura que tô fazendo sobre a história da bruxaria...
Küss 😘
Oie, tudo bem? Que visão mais interessante. Desde que era adolescente esse tema sempre me chamou atenção. Sempre me perguntei "de onde vieram as bruxas", porque elas eram perseguidas, porque elas eram consideradas "mágicas" e muitas outras dúvidas. Tanto que li Brida do Paulo Coelho. Não é histórico mas alimentou minha curiosidade. Sempre que alguém fala sobre lembro da Inglaterra ou da Revolução Industrial. Um abraço, Érika =^.^=
ResponderExcluirOie Lilian!
ResponderExcluirAdorei a indicação e essa super resenha completíssima. Não conhecia esse livro, mas estou super interessada pois tenho Calibã e a bruxa aqui na lista de não lidos. É muito importante esse tipo de abordagem que nos mostra que a caça às bruxas não é algo do passado, e que as bruxas somos nós.
Adorei o projeto que estão fazendo, com leituras feministas. Acho essencial para os tempos que vivemos!
Esse livro, é um daqueles que uma unica leitura nao vai ser suficiente.
ResponderExcluirFiquei imaginando a quantidade de pesquisa que autora deve ter feito pra abordar um tema tao cheio de mitos
Estou adorando acompanhar esse projeto, pois estou achando ótimos livros e estou anotando todos. Acho que como mulher, preciso conhecer mais sobre nossa história e saber me posicionar, pois em todos os momentos estão nos olhando.
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