Resenha – O Conto da Aia - uma realidade não muito distante
O
Conto da Aia, de Margaret Atwood, publicado originalmente
em 1985, relançado pela Editora Rocco, é um romance distópico e
perturbador, que retrata a materialização de uma sociedade pautada no
fundamentalismo cristão e regime totalitário. De modo que Simone Beauvoir sintetiza
bem o contexto da obra.
“Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida” (Simone Beauvoir)
Offred é uma Aia. Seu nome significa que
ela pertence a um comandante. A Aia é uma mulher fértil, logo, seu o corpo é
propriedade do governo para procriação. Isso pois, depois de guerras e
devastação ambiental causadas pelo homem, existem poucas mulheres férteis.
Elas, as Aias, são treinadas para servirem
sexualmente aos Comandantes (com a finalidade de procriação) e as suas Esposas,
mulheres inférteis. Quando elas finalmente engravidam é feito um ritual de
parto para conectar a Aia à esposa do comandante, concomitantemente, enquanto
uma vivencia o trabalho de parto, a outra simula. Além das Aias e mulheres
casadas, existem as Marthas e as Tias que são as responsáveis por educar as Aias
a serem recatadas, exemplo disso é a ideia de que a mulher é sempre culpada
pelo estupro.
“O costumeiro, dizia Tia Lydia, é aquilo a que vocês estão habituadas. Isso pode não parecer costumeiro para vocês agora, mas depois de algum tempo será. Irá se tornar costumeiro. ”
Essas mulheres são facilmente
identificadas pelas roupas, melhor dizendo, pelas fardas. A farda tem um
aspecto ideológico que é o de silenciar a identidade do indivíduo em detrimento
da instituição. Ou seja, se você não tem identidade, quem é você? As Aias usam
vermelho, as Marthas, serviçais inférteis, verde desbotado. O livro possibilita
fazer a análise dos elementos que compõe essas vestimentas como ferramenta de
repressão e alienação.
“Eu me levanto da cadeira, avanço meus pés para a luz do sol, até os sapatos vermelhos, se salto para poupar a coluna e não para dançar. As luvas vermelhas estão sobre a cama. Pego-as, enfio-as em minhas mãos, dedo por dedo. Tudo, exceto a touca de grandes abas ao redor de minha cabeça, é vermelho: da cor de sangue, que nos define. A saia desce à altura de meus tornozelos, rodada, franzida e presa a um corpete de peitilho liso que se estende sobre os seios, as mangas são bem largas e franzidas. As toucas brancas também seguem o modelo padronizado; são destinadas a nos impedir de ver e também de sermos vistas. Nunca fiquei bem de vermelho, não é a minha cor.”
A repressão atinge a todos que forem
contra o sistema, lógico, isso inclui homossexuais, apoiadores do aborto, etc. que
eram enforcados e expostos para que servisse de exemplo, como dispositivos de
punição. Vale neste caso lembrar Michel Foucault que ressaltou a barbárie da
punição como espetáculo público até o século XVIII, onde era preciso torna-la
natural e interessante, o efeito dessa punição passa a ser um ‘bem social’.
“(...). Cometeram atrocidades e devem ser transformados em exemplos, para os outros. (...) O que se espera que sintamos por esses corpos é ódio e desdém. ” (O Conto da Aia, p. 45)
Em meio a tanto horror, estupro,
alienação, mortes, degradação, constante vigilância, sem permissão para ler ou
escrever, Offred tenta manter sua verdadeira identidade e sanidade vivas entre as
lembranças de sua família e a tensão da nova vida na sociedade de Gilead,
antigo Estados Unidos da América.
A
Conto da Aia não está longe da realidade em que
vivemos, a diferença é que vivenciamos a perseguição a determinados grupos, e no
livro todos são atingidos pelo ódio do fundamentalismo cristão e regime
totalitário. E infelizmente seguimos para esse caminho, ‘mitos’ que representam
a extrema direita ou Neonazismo, o fundamentalismo cristão em forma de partidos
políticos, a mídia alienadora forma a mistura venenosa de uma realidade muito
próxima.
Nossa, parece ser uma história muito forte e, apesar de escrita há tantos anos atrás, muito atual também. Ficamos horrorizados quando lemos essas coisas, mas nossa sociedade não age muito diferente e isso é o mais triste.
ResponderExcluirOlha, você foi generosa, estamos tão próximos dessa realidade, o Brasil está tão doente com o fundamentalismo que tenho medo, muito medo.
ExcluirEu li "O conto da Aia" e também assisti a série. Realmente não é uma realidade distante e o pior nada acontece de um dia para outro e as vezes começa como uma frase qualquer de um grande apresentador que o povo vai relevando por ter mais de 80 anos e ele continua oprimindo as mulheres que trabalham pra ele. Enfim, esse livro me bateu um super medo.
ResponderExcluirOi,
ResponderExcluirNão conhecia essa história mas ela pareceu bem pertubadora, retratando temas que temos ainda nos dias de hoje de uma maneira bem impactante. Não sei se teria estômago para ler, mas com certeza é um bom livro que faz repensar algumas das nossas atitudes como sociedade ultimamente.
Beijos
Raquel Machado
Leitura Kriativa
leiturakriativa.blogspot.com
Uma leitura e tanto, algo de tirar o fôlego. O quê não difere o dia-a-dia de muitas mulheres, sejam elas brasileiras ou não.
ResponderExcluirCom certeza é um conto que adoraria ler.
Beijos.
https://cabinedeleitura0.blogspot.com.br/2017/09/voce-quer-um-balao.html
Extremamente é uma história muito forte, que vamos dizer que revela o que a sociedade vivencia, mas aqui é tudo tão normal e banal que nem dão atenção, infelizmente. Adoraria ler esse livro.
ResponderExcluirBeijinhos
Olá Lilian,
ResponderExcluirNão sei se você sabe, mas tem uma série baseada no livro e estou morrendo de vontade de ver. Confesso que não sabia da existência do livro até ler sua resenha, mas agora já quero muito adquirir o meu exemplar e realizar essa leitura. Gostei muito da primeira citação, realmente devemos ficar vigilantes quanto aos nossos direitos. Sua resenha está fantástica e me deixou sedenta por essa história tão rica,emocionante e que faz uma crítica e reflexão consistente sobre os direitos das mulheres.
Abraços,
Cá Entre Nós
Olá Lilian!
ResponderExcluirNossa esse conto tem quase a minha idade. Caramba!
E mesmo com tantos anos dele escrito podemos perceber que se mantém bem atual, afinal vivemos a cada dia mais tendo nosso direito de ir e vir roubado diante da nossa sociedade hipócrita e tão preconceituosa, sobretudo no que diz respeito aos direitos das mulheres.
Adorei poder conhecer mais sobre o conto da Aia através do seu olhar.
Beijos!
Camila de Moraes
Oi, tudo bem?
ResponderExcluirLi várias resenhas sobre esse livro, vi até algumas matérias na TV sobre o alardio que de repente este livro criou.
Me parece ser uma história bem interessante, forte mas infelizmente no momento não é a leitura que eu gostaria de fazer. Quem sabe uma outra hora.
Beijos e até a próxima!
Olá, tudo bem? Nossa, não conhecia este conto, mas parece ser bem forte, ein?! Adorei sua resenha e fiquei curiosa, apesar de ter um pouco de "medo" do que vou encontrar, rs.
ResponderExcluirBeijos,
Duas Livreiras / Sorteio "O gnomo Elias"
Hey,
ResponderExcluirEsse livro tem uma premissa muito interessante e real, não é? Acho que é isso que fez ele fazer tanto sucesso. Esse livro é doloroso ao extremo e isso me assusta, mas agrada, pois acho que precisamos conhecer nossa história para que ela não se repita.
Adorei sua resenha e fiquei muito interessada em fazer a leitura.
Beijos,
Um Oceano de Histórias
Embora eu tenha curiosidade para ler esse livro, eu ainda não tive coragem. Deve ser uma leitura bem difícil de realizar por conta de tanta crueldade.
ResponderExcluirOi.
ResponderExcluirAgora que vi a capa do livro, me lembrei dele. O vi no Skoob, mas não sabia muito sobre a obra. Depois da sua Resenha, eu tenho que ler esse livro. Deve se tratar de uma leitura maravilhosa e tenho certeza que não vou me arrepender de ter o lido.
Oi!!
ResponderExcluirQuando eu vi que a rocco postou fotos desse livro eu fiquei bem intrigada, queria saber sobre o que se tratava.
Ai que horror, isso de seu corpo ser usado para procriação. Estou horrorisada e ao mesmo tempo quero ler esse livro.
A tua resenha está perfeita, preciso ler esse livro.
Beijão!
Oi Lilian, tudo bem?
ResponderExcluirEu li esse livro recentemente e também achei perturbadoramente atual. Apesar de não vivermos um regime totalitário atualmente, muitos dos valores da sociedade apresentada na época estão presentes na nossa sociedade. Entre eles a homofobia e o machismo, infelizmente. Afinal, quantas vezes vemos mulheres vítimas de estupro sendo responsabilizadas pelo que aconteceu a elas.
É uma leitura de fato perturbadora e muito reflexiva, mas também necessária. Amei sua resenha e as reflexões que você fez sobre a obra.
Beijos!
Olá!
ResponderExcluirJá vi algumas resenhas dele e é um tanto brutal um livro ser tão antigo e ao mesmo tempo tão atual. Só que nos diferencia da sociedade retratada no livro é que (ainda) não vivemos num regime totalitário. Parabéns por sua análise.
Olá Lilian, essa é um livro que eu tenho muito vontade de ler, eu assisti recentemente a série que foi lançada baseada no livro e adorei a forma que essa sociedade foi retratada e a forma que a protagonista luta para não se perder em meio a ela.
ResponderExcluirTerminei ontem a série e já estou roendo as unhas pela continuação 💙💙💙💙💙
ExcluirOie
ResponderExcluirmuito legal sua dica de conto, gostei bastante da ideia e do tema pertinente, parece ser uma leitura verdadeiramente inteligente e valiosa, parabéns pela dica e resenha
beijos
http://www.prismaliterario.com.br/
mlr, agora mais do que nunca preciso tirar a poeira da minha edição velhinha e ler saporra. com uma puta análise dessas, é pra torar, viu? certeza que a leitura vai me deixar perturbada... excelente analogia com nosso momento político-social atual...
ResponderExcluir<3