Resenha – Machado de Assis: do folhetim ao livro

Para se deleitar na verdadeira riqueza literária de Machado de Assis, é necessário que o leitor seja curioso, esteja disposto a não ser um mero decodificador e vista a roupagem do pesquisador. Desenvolvendo o talento de Sherlock Holmes da literatura. E foi exatamente isso que Ana Cláudia Suriani da Silva fez em Machado de Assis: do folhetim ao livro, 288 páginas, nVersos Editora.  

“(...) porque este trabalho busca compreender o Machado artista, ou mais especificamente, o romancista, diante da tarefa de dar corpo, unidade e, finalmente, concluir uma obra que se encontrava em andamento. ”

O livro é uma pesquisa de cinco anos, ou talvez até mais, que mostra as nuances de Machado e que discorrem do folhetim até o livro. Seu caráter inédito tem vida quando a pesquisa consegue mapear para análise alguns capítulos do folhetim de Quincas Borba, até então inéditos por ter sido considerados como perdidos.

A importância do estudo viabiliza o conceito que os escritos de Machado passam por mudanças significativas quanto a publicação que implicam em sua compreensão, considerando, portanto, o contexto em que foi publicado. A exemplo do folhetim, existe a relação dos capítulos publicados, o tempo de publicação, como esse texto vai dialogar com outras colunas do folhetim e a diferença linguística enquanto romance. Além do meio de publicação é interessante considerar público alvo, formato do periódico, espaço destinado ao autor, composição tipográfica, etc.

“Para representar uma sociedade em transformação, Machado opta por um narrador em terceira pessoa, o que permite que as diferentes personagens apresentam a sua própria visão dos fatos, compondo o que chamo de um caleidoscópio narrativo. ”

A autora foi cuidadosa para não deixar passar todos os elementos que materializam a importância do autor, inclusive as próprias dificuldades de publicação dos livros, quanto ele ganhou, quais editoras assinou contrato e as discussões acerca da diagramação, como isso pode afetar o público alvo e o discurso da obra.

Em uma interpretação particular, acredito que Machado visualizava a escrita como arte, e isso não passava apenas no processo textual, para ele era todo um conjunto que merecia ser respeitado. Caso contrário, o autor fazia objeções que com o tempo o foi deixando estafado e ele não mais publicou em periódicos.

“O valor artístico das narrativas escolhidas poderia ser medido pela ‘má’ apresentação do volume, ou por uma apresentação que o aproxima de livros baratos. ”

Mesmo quando ele passa a publicar seus romances, suas objeções não cessam quanto a possível má apresentação de uma obra. A linguagem do livro é acessível, a leitura flui tranquilamente, o público alvo não é necessariamente direcionado estudantes de Letras, a obra é recomendável para curiosos, amantes da escrita de Machado, estudes, professores, universitários, jornalistas, mediadores de leitura etc.

É uma fonte de informação rica, ampla e que fazer jus a genialidade de Joaquim Maria Machado de Assis. Quanto ao trabalho da editora, só tenho elogios, está perfeito.